amores expresos, blog da CECÍLIA

domingo, 17 de junho de 2007

Onde a terra acaba

Aqui. Acaba aqui. Terminei há poucos minutos o meu romance para a coleção Amores Expressos. Terminei. Está terminado. Anexei a um e-mail e o despachei para os senhores Teixeira e Cuenca. Foi, está indo. Partiu, saiu de mim.

Foram quase sessenta dias desde as primeiras anotações e esboços, ainda em São Paulo, até a revisão final, iniciada ontem, às 23:57hs, e terminada hoje, às 23:18hs. Parei para dormir um pouco, às quatro da manhã, retomei às nove horas e prossegui ininterruptamente, ou quase (vi a largada da corrida de Fórmula 1 e algumas cenas do filme A Dama na Água com Camila, a minha esposa).

A etapa final do processo de criação foi acompanhada de perto por Tércia Neiva, membro destacado da confraria LSOAL (Leitores que Sofrem os Originais de André de Leones), sem a qual meu romance resultaria pior, tenho certeza. Ao todo, foram quinze tratamentos (fora as versões manuscritas, difíceis de computar, pois não coloquei datas e tudo está uma confusão só) e inúmeras revisões.

Além da Tércia, outros cinco "revisores" informais, todos amigos meus e integrantes da LSOAL, acompanharam o trabalho passo a passo, apontando problemas, questionando soluções, atacando as falhas e sugerindo desdobramentos. Contei, ainda, com dois revisores profissionais, contratados para fazer uma leitura, na medida do possível, isenta e distanciada(afinal, todos da LSOAL são meus amigos). Os pareceres desses dois revisores foram, também, bastante positivos. A única crítica de um deles: tem muito sexo. O que, é claro, encarei como um elogio.

E agora, bem, terminou. Estou exausto.

domingo, 10 de junho de 2007

Sobre biscoitos e catedrais

Um leitor chamado Paulo me mandou um e-mail simpaticíssimo (depois daquele da tal da Leila, qualquer e-mail seria simpático, mas o do Paulo é realmente simpático). Não vou transcrevê-lo aqui como fiz com os outros porque esse lance está ficando chato (não pelos e-mails, claro, mas por minha culpa mesmo, não?), mas quero comentar algumas coisas sobre esse e-mail.

Além de Raduan Nassar, que levou aqueles quinze dias pra escrever Um Copo de Cólera, Paulo me lembra que escritores tão díspares quanto Franz Kafka, Lourenço Mutarelli e Carlos Heitor Cony também escreveram um ou outro de seus livros em tempo recorde. Por outro lado, penso que seja o caso de deixar isso pra lá, não? Os idiotas, como eu escrevi anteriormente, sempre vão encontrar algo novo pra encher o nosso saco. Então, melhor deixar pra lá.

O e-mail do Paulo foi bacana também (e principalmente) por trazer uma historinha envolvendo Fernando Sabino e Guimarães Rosa que eu não conhecia. Acho que ela tem tudo a ver com algumas coisas que venho escrevendo aqui sobre a necessidade de os escritores serem, sim, pretensiosos, mesmo presunçosos, e de arriscarem mais, sem medo de "errar" ou de quebrar a cara. Enfim, Rosa ligou certa vez para Sabino e perguntou o que ele andava fazendo. E então:

SABINO: Estou escrevendo um livro assim, assado.
ROSA: Não faça biscoitos, Fernando, faça catedrais.

quinta-feira, 7 de junho de 2007

A montanha mágica

Surtei legal. Perdi completamente a noção do tempo. Andando pelo apartamento e falando sozinho. Altos papos com os personagens. Alucinações, também. Vozes. Ou talvez eu estivesse dormindo e sonhando e achasse que estivesse acordado, sei lá. Aí eu liguei pro doutor Walter. E ele me proibiu de trabalhar ao computador por, pelo menos, três dias. "Pode entrar, ler as notícias, ver pornografia, atualizar os blogs, mas nada de trabalhar no romance. E, mesmo que for ligar o PC pra ver essas coisas, te proíbo de ficar mais do que duas horas com a cara grudada na tela. Sacou?" Saquei, doutor. Saquei.

Isso foi agora há pouco. Entendi direitinho. Três dias sem trampar no romance aqui nesse troço. A minha saúde e coisa e tal. A minha sanidade e coisa e tal. Daí que não me restou outra alternativa: se o médico me proibiu de passar horas e horas escrevendo e reescrevendo e revisando o meu romance na frente desse computador, se o médico me proibiu até mesmo de ficar na frente desse computador por mais de duas horas diárias nos próximos três dias (pelo menos), bem, eu não tive escolha e, sim, fui obrigado a imprimir as 158 páginas do meu livro pra poder trabalhar nele logo ali, sentado à mesa da sala. Bem longe do computador, do jeito que o médico mandou. Minha montanha mágica particular não tem Setembrini, mas é de madeira vagabunda, tem quatro cadeiras, a luz é boa e, de vez em quando, eu olho o Aeroparque pela janela, iluminadão. Eu moro na Park Avenue de Paranaguá, afinal de contas. E desde as quinze horas eu não escuto vozes.

domingo, 3 de junho de 2007

Um adendo ao post anterior

Um Copo de Cólera, de Raduan Nassar, foi escrito em quinze (15) dias. Numa entrevista, o autor afirmou que não importa se o livro é escrito em quinze dias ou quinze anos, porque um bom livro é escrito a vida toda.

Agora, sim, vou dormir.

Sobre o tempo - Um e-mail



SOBRE O TEMPO

Tenho lido pela internet, especialmente em blogs, a desconfiança de algumas pessoas em relação ao projeto Amores Expressos, desta vez no que se refere ao prazo de que nós, autores, dispomos para entregar os originais. Antes, o tiroteio dizia respeito a um suposto financiamento das viagens com verba de renúncia fiscal (isso já foi esclarecido, não?). Logo em seguida, passaram a reclamar de um suposto compadrio na escolha dos participantes (desmentido, vejam só, por mim: nunca tinha ouvido falar de Rodrigo Teixeira e não conhecia João Paulo Cuenca nem pela internet). Agora, o problema é o tempo. Dizem ser impossível escrever um bom romance em tempo tão curto (noventa dias no total). Ah, eu não sei. Quer dizer, eu estou escrevendo o meu romance, estou dentro do prazo acertado e, caramba, estou gostando do resultado. Eu e as pessoas que habitualmente lêem os meus originais durante o processo de criação (ver segundo tópico desta postagem).

Assim como muitos me desprezaram de antemão por ser o único autor com destino doméstico (como se o destino de cada escritor é que fosse determinar a qualidade de cada romance), outros (ou os mesmos, vai saber) agora se erguem (de onde?) pra dizer que livros escritos em prazo tão curto não podem ser bons. Eu digo que podem, sim. Eu digo que tudo é possível. É possível um romance trabalhado por quarenta anos ser uma merda, e é possível um romance escrito em quarenta dias ser uma beleza. Mas quem sou eu, né? Tipo, não sou ninguém. Tenho tudo pra provar. Mas posso dizer e digo: ESPEREM OS LIVROS. Posso dizer e digo: LEIAM ANTES DE JULGAR. E fico aqui imaginando o que vão arrumar em seguida pra encher o nosso saco.

***

UM E-MAIL

Tenho alguns poucos e excelentes amigos que acompanham todo o meu processo criativo. Gente boa como Wesley Peres e Lúcia Bettencourt. Apelidei essa galera de LSOAL (Leitores que Sofrem os Originais de André de Leones). Eles lêem e dizem, com toda a franqueza, o que estão achando. Apontam desde erros ortográficos e de sintaxe até problemas estruturais. Criticam sem dó. E isso é muito bom. Pessoas que respeito e em quem confio lendo meu romance-em-progresso e, sim, me ajudando a escrevê-lo, chamando a minha atenção aqui e ali, não me deixando perder o foco.

Recebi, há algumas horas, um e-mail de Tércia Neiva, integrante do LSOAL. Ainda ontem, enviara para ela o tratamento mais recente do romance. Ela me escreveu o seguinte:

André,

Acabei de ler a última versão de seu romance. Colei meus olhos nele durante 4 horas, entre 7 e 11 horas da noite, e agora posso lhe dizer, aliterando despudoradamente: Tem um mar ali dentro, meu amor. Maravilhas. Todas sustentadas por palavras que o dizem, André, uma a uma iluminando, catalisando o que, sem dor e elipses, dificilmente se verbaliza. Tudo foi idéia sua. Todos os cenários possíveis. Personagens à beira de morte súbita. Bacana do começo ao fim (até porque sei que você voltará aos trechos em costura e, logo, logo, de forma rigorosa, vai lhes dar o devido acabamento).

Seu trabalho em ritmo frenético e seu rigor me impressionam, André. Nada lhe escapa. Onde antes a criatura parecia oscilar, foi exatamente lá que, versão a versão, você foi magistralmente intervindo. Golpes de mestre. Você sempre sabe onde está indo e para quê. Imagina, então, André, com que alegria revi, nessa última versão do seu romance, boa parte dos artifícios que você antes havia utilizado na antepenúltima versão.

Agora sua obra, aos meus olhos, recuperou o ritmo, o humor e a ironia, o sarcasmo e a dor que a particularizavam. Mais especificamente: recuperou as múltiplas vozes que lhe eram imprescindíveis. Todas se articulando, se imiscuindo, participando de uma narrativa complexa, transcorrida num tempo-espaço multifacetado, caleidoscópico. Mas nunca é só isso, não?(Que fique entre nós um segredo: dentre todas as vozes que antes você havia "suprimido", confesso que a da Maria Paula era, aos meus ouvidos, a que havia deixado um vazio maior).

Outra alegria que experimentei lendo o seu romance, sabe qual foi, André? Ver literatura, música, Sampa e informática "interagindo" funcionalmente, tudo bem dentro da narrativa que você criou, inclusive naquilo que se refere à, digamos, dicção paulistana e à dicção internética. Ver um roteiro (?) de cinema, um curta-metragem, incluído no seu romance foi uma alegria especial, principalmente por se tratar de um romance seu.


É isso. Depois de passar, em média, dezesseis horas, às vezes dezoito, na frente do computador, trabalhando, fazendo o impossível pra entregar um livro decente, um bom romance, ler esse tipo de coisa é maravilhoso. Porque são as palavras de alguém que está acompanhando o meu trabalho, não de um palpiteiro virtual qualquer que desclassificou o meu livro meses antes de ele começar a ser escrito simplesmente porque meu destino era São Paulo e não a Cidade do Cabo ou Plutão ou porque o "prazo é curto demais". É mesmo. O prazo é curto mesmo. Mas eu sabia disso desde o começo. E, a essa altura, posso dizer: é irrelevante. Nesse caso específico, do livro que me propus escrever e que estou escrevendo nessas circunstâncias, eu digo e repito: NÃO FAZ A MENOR DIFERENÇA.

Ademais, obrigado, Tér. Agora, com licença, eu preciso dormir um pouco.