amores expresos, blog da CECÍLIA

terça-feira, 20 de maio de 2008

Entrevista para o ODISSÉIA LITERÁRIA

Leandro Oliveira me entrevistou para o seu Odisséia Literária. Na conversa, falei sobre a minha participação no Amores Expressos e também sobre o meu livro de contos, que sai em novembro deste ano.

A entrevista foi originalmente publicada AQUI. Autorizado pelo Leandro, eu a reproduzi abaixo.

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ANDRÉ DE LEONES E O AMORES EXPRESSOS

O goiano André de Leones é um dos escritores que participaram do projeto Amores Expressos. Seu livro Hoje Está um Dia Morto venceu o Prêmio Sesc de Literatura 2005 e foi publicado pela editora Record. Conversei brevemente com ele sobre o projeto Amores Expressos - e naturalmente o livro que escreveu para este projeto -, além seu novo livro de contos Paz na Terra Entre os Monstros que deverá ser lançado também neste ano.

Leandro: Em primeiro lugar, a pergunta inevitável: como será o livro que sairá pelo projeto Amores Expressos? Qual é o título e como será a história?

André: O título é Todos os lugares estranhos. Caso a Companhia das Letras aceite publicá-lo, pode ser que o título mude no processo de edição. Estou sempre aberto a sugestões.

Trata-se de um romance com várias histórias e personagens com maior ou menor ligação entre si. É fragmentado, mas todas as histórias têm algo em comum: são recomeços. Não por acaso, o livro começa com um rompimento. Nesse nível, o que me interessou foi abordar e desenvolver personagens que, após relacionamentos que deram errado, não fugissem de novas relações, não se escondessem.

Além disso, há desde personagens na faixa dos vinte anos até uma senhora que sofre uma dor de cotovelo avassaladora aos setenta. Isso também me interessou: narrar encontros, desencontros e reencontros amorosos (e sexuais) de pessoas bem mais velhas do que eu, mas sem afetação, sem apelação, mas também sem condescendência ou coisa parecida.

O livro tem muito sexo, o que não vai espantar quem leu o meu primeiro romance. Aliás, esse tipo de coisa não devia espantar mais ninguém. Vão dizer que lembra Bukowski, mas eu nunca li Bukowski.

Estruturalmente, o romance é dividido em três partes. A primeira e a terceira são narradas em terceira pessoa; uma (a primeira) apresenta e a outra (a terceira) meio que se despede dos personagens. A segunda parte é narrada por várias primeiras pessoas e cada um de seus capítulos tem uma forma específica: há um capítulo em forma de blog, outro em forma de roteiro de cinema, outro na forma de uma troca de e-mails etc. Isso não é gratuito, pois sempre tem a ver, de alguma forma, com o personagem que está narrando.

Em termos bem gerais, é isso.

L: Você foi o único escritor que ficou no Brasil. Como foi a viagem? O que foi para a ficção e o que da viagem não coube na ficção?

A: A viagem foi bem tranqüila. Nos primeiros dias, circulei um bocado por São Paulo, tateando, procurando por lugares e pessoas que me dissessem alguma coisa, até me fixar nas imediações da rua Augusta. Eu estava hospedado ali perto e transformei alguns dos bares da região (Ibotirama, Charme) em postos de observação, por assim dizer. Passei muito tempo nesses lugares e decidi que uma das histórias de amor que eu narraria seria a de um casal de lésbicas (a essa altura, eu já tinha decidido que o livro seria fragmentado e com várias histórias correndo paralelas). Vi e ouvi muita coisa, e inventei muito mais a partir disso.

Muita coisa não coube na ficção. A periferia, por exemplo. No começo, cheguei a imaginar uma relação entre pessoas de classes sociais diferentes, mas não tenho bagagem para criar e desenvolver uma trama dessas. Sou de classe média. A periferia já tem vozes contando as suas histórias, e não só por meio da literatura.

L: O projeto Amores Expressos reuniu características que assustam muitos escritores: um tema definido, um prazo determinado, um trabalho em paralelo (o documentário). Apesar disso, você foi um dos primeiros a entregar o livro. Não se sentiu pressionado por tudo isso? Ou foi como outro livro que já escreveu? Havia algo já pronto no início do projeto?

A: No começo, eu me preocupei com o prazo. Em condições normais, escrevo muito lentamente. Assim, cheguei a pensar que não conseguiria entregar o livro dentro do prazo, mas decidi fazer o possível. Sempre respeito esse tipo de coisa, e achei que parte da experiência estava em justamente escrever um bom livro dentro do prazo estabelecido.

Fui para São Paulo com algumas coisas esboçadas, idéias soltas, inícios de possíveis histórias, mas acabei não usando nada disso. A cidade me levou em outras direções, felizmente (os esboços, idéias soltas e inícios eram bem ruins).

Ademais, o romance saiu exatamente como eu queria. O prazo e o tema não me atrapalharam, portanto. O João Paulo Cuenca, coordenador editorial do projeto, gostou do resultado e disse que eu me apropriei do tema, que eu o tornei algo meu. Era um outro medo que eu tinha, de que o romance não tivesse a minha cara, parecesse algo forçado. Felizmente (para mim e, espero, para os editores e para os leitores), saiu como eu queria e tem tudo a ver comigo e com o que eu já vinha fazendo.

L: Com respeito ao documentário, muitos vêem de forma negativa a exposição da imagem do escritor, preferem fugir de atividades que não envolvem o ato de escrever. Acha que isso é algo inevitável? É positivo para a divulgação da literatura?

A: Acho que é positivo para a divulgação da literatura. Os documentários (dezessete, um por autor) serão exibidos na televisão e chegarão a muita gente que nunca ouviu falar do projeto, que nunca ouviu falar de mim e dos outros autores. Acho que isso não é ruim.

Por outro lado, o mercado editorial não permite que a esmagadora maioria dos escritores viva dos direitos autorais. Assim, para sobreviver é preciso recorrer a outras atividades que não envolvem diretamente o ato de escrever (palestras, por exemplo). O problema é quando essas “outras atividades” acabam se tornando mais importantes (ou visíveis) do que a literatura em si. É necessário encarar os documentários do projeto, por exemplo, como coisas acessórias. Os livros é que são importantes. Tudo deve convergir para eles. Do contrário, a coisa se torna um circo.

L: Por último, Paz na Terra Entre os Monstros, seu novo livro de contos, também sairá nesse ano, não é? Foram escritos em paralelo? Você programou uma espécie de rotina de trabalho ou ter dois livros prontos num mesmo ano foi algo circunstancial?

A: Comecei a trabalhar em Paz na Terra Entre os Monstros em meados de 2000 e o dei como terminado em julho de 2006, quando enviei os originais para a Record. Fui convidado para o Amores Expressos em janeiro de 2007. Logo os livros não foram escritos em paralelo. O meu primeiro romance (Hoje Está um Dia Morto, Record), sim, foi escrito em paralelo a alguns dos contos de Paz na Terra Entre os Monstros, durante os anos de 2004 e 2005.

Depois de entregar os originais de Todos os Lugares Estranhos, voltei a Paz na Terra Entre os Monstros e o revisei em conjunto com o meu editor Flávio Izhaki. Alguns contos saíram, outros entraram, tudo foi retrabalhado e o livro ainda passará por duas revisões antes de ser lançado, em novembro deste ano. Caso a Companhia das Letras aprove a publicação de Todos os Lugares Estranhos, imagino que o trabalho de edição não será menos minucioso. Assim espero, pelo menos.